7 novembro, 2024

Uma questão de abordagem

Como atuante há mais de dez anos em Psicologia e em Saúde Mental, algo que sempre me incomodou, mas que tem se intensificado com a forma como a saúde mental tem sido vendida, é a ideia de que existe uma psicoterapia específica a depender do diagnóstico da pessoa. A psicoterapia, ou qualquer terapia de cunho subjetivo, tem o caráter de atuar em um nível de subjetividade que não permite a divisão do sujeito em caixinhas. Ao pensar em saúde mental estamos lidando com algo muito mais complexo que com “um sintoma”. Não se cuida do sintoma, mas do sujeito de forma integral. Compartilho esse pensamento a partir da teoria “fatores comuns das psicoterapias”, que afirma que não é a abordagem psicológica que é relevante, mas o indivíduo que atende, a psicoterapeuta, ou o psicoterapeuta. 

A ideia central da pesquisa sobre os fatores comuns em psicoterapia parte do princípio de que a eficácia de um processo psicoterapêutico não se deve a uma técnica ou abordagem específica, mas sim a elementos mais gerais presentes em todas ou na maioria das terapias. Segundo a teoria a mudança produzida em psicoterapia é oriunda de fatores interpessoais, que em maior ou menor grau, são comuns a todas as abordagens psicoterapêuticas.

Carl Rogers foi um dos principais precursores desse aporte teórico. Segundo o autor, o fator mais relevante no processo psicoterapêutico são as atitudes facilitadoras, nomeadas por ele de Condições Necessárias e Suficientes em Psicoterapia Nesse modelo terapêutico a relação entre terapeuta e cliente é fundamental para o processo de mudança. E assim, Rogers identificou condições necessárias e suficientes para que a psicoterapia seja eficaz.

O que são essas condições?

São atitudes do terapeuta em relação ao cliente que, segundo Rogers, são essenciais para criar um ambiente terapêutico propício à mudança. Essas condições são:

  • Congruência ou autenticidade: O terapeuta precisa ser genuíno e autêntico na relação com o cliente. Isso significa que o terapeuta deve ser congruente com seus sentimentos e pensamentos, evitando apresentar uma fachada profissional.
  • Consideração positiva incondicional: O terapeuta deve aceitar o cliente como ele é, sem julgamentos ou condições. Essa aceitação incondicional cria um ambiente seguro para o cliente explorar seus sentimentos e pensamentos, mesmo os mais dolorosos.
  • Compreensão empática: O terapeuta precisa se colocar no lugar do cliente e tentar entender o mundo a partir da perspectiva dele. A empatia permite que o terapeuta se conecte com o cliente de forma profunda e significativa.

Outros autores exploraram essa temática, criando o campo da teoria dos fatores comuns em terapia. Dentre os fatores citados podemos resumir basicamente os mais importantes: a catarse, empatia, aceitação, vínculo interpessoal, verbalização e outros. Em cada abordagem teórica temos distintos termos, mas que resultam em aspectos semelhantes.

  • Relação terapêutica: A base de qualquer psicoterapia é a relação estabelecida entre o terapeuta e o paciente. Essa relação, caracterizada por confiança, empatia e respeito mútuo, cria um ambiente seguro para a exploração de sentimentos, pensamentos e experiências.
  • Exploração de sentimentos e pensamentos: Em todas as psicoterapias, o paciente é encorajado a explorar seus sentimentos, pensamentos e experiências de forma profunda e honesta. Essa exploração permite um maior autoconhecimento e compreensão dos padrões de comportamento.
  • Aprendizado de novas habilidades: As psicoterapias visam ensinar novas habilidades para lidar com situações desafiadoras e promover o crescimento pessoal. Essas habilidades podem incluir técnicas de relaxamento, resolução de problemas, comunicação assertiva, entre outras.
  • Mudança de padrões de comportamento: A psicoterapia busca modificar padrões de pensamento e comportamento que causam sofrimento. Através de diferentes técnicas, o paciente aprende a identificar e desafiar crenças disfuncionais e a desenvolver comportamentos mais adaptativos.
  • Fatores esperança e expectativa: A crença de que a terapia pode ser eficaz e a expectativa de mudança são fatores importantes no processo terapêutico. A esperança motiva o paciente a se engajar no tratamento e a persistir diante de desafios.

REFERÊNCIAS

ROGERS, C. R. Condições necessárias e suficientes para a mudança terapêutica na personalidade (1957). In: WOOD, J. K.; DOXSEY, J. R.; ASSUMPÇÃO, L. M. et al (org.). A abordagem centrada na pessoa. 5. ed. Vitória: EDUFES, 2010

Fatores Comuns e mundanças em Psicoterapia (2008) https://encr.pw/3FLgR

Therapeutic alliance, empathy, and genuineness in individual adult psychotherapy: A meta-analytic review. (2018) https://encr.pw/PNubt

How important are the common factors in psychotherapy? An update (2015) https://acesse.dev/BZnuS

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